terça-feira, 30 de maio de 2023

Sobre sermos nós


Há dez dias sem escrever… significa algo, tudo significa (dependendo do estado de espírito). Parei para ler a segunda autobiografia da Rita e durante a leitura nasci e morri incontáveis vezes, assim como na leitura da primeira. Santa Lee, padroeira da liberdade e do deboche, te amo. Queria ter sua coragem de viver, ter três filhos, viver meu amor, dominar o mundo e morrer em paz no mato junto aos bichos e humanos que amo. Schiller pensava que a humanidade se esforça para parir de vez em quando uma pessoa genial, para dar aquela chacoalhada em sua própria história, para dar mais alguns passos em direção a si mesma. Não é legal pensar que a humanidade pariu a Rita Lee para se enxergar?

Sobre as coragens, não são falta de medo, certo? Estão mais ligadas à capacidade de irmos com medo mesmo. Há quem me ache corajosa, minha família talvez, alguns amigos, raramente consigo concordar com algum deles. Mas como Rita escreveu: “Sou tão distanciada de mim mesma [...]. Somos tão parecidas e tão diferentes. [...]. Diferentes porque ela seguiu o caminho da música enquanto eu ficava espiando o show da coxia e depois dizia que foi bacana - no que ela nunca concordava comigo.”.

Eu me sinto assim, numa espécie de contrário. As imagens, a literatura e por fim a música, sempre nos salvam. Porque amo e odeio profundamente a moça que me olha no espelho e só a arte me deu e dá forças para a encarar, supor suas dúvidas e medos e os escancarar, já que ela mesma não tem coragem. Quando tomo as rédeas grito seus problemas para que alguém os escute, já que ela mesma não fala. Escrevo textos, componho músicas e a faço cantar: cante, caralhos e úteros! Cante! Eu digo a ela. Cante pulando, urrando pelada! E ela canta chorando, depois diz “ah essa letra, diz o que sinto mesmo…”.

Se não fosse por mim, a moça do espelho não faria nada nunca. Se não houvesse dentro de mim uma outra, não saberia dizer o quanto me atrai e repulsa a existência em si e eu me encerraria em meu próprio silêncio. Sinto agora uma leve (e questionável) alegria por ser quem sou - tão raro esse sentimento, melhor encerrar aqui.

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