quinta-feira, 18 de maio de 2023

Registro 027

06/07/22

Sobre a exigência do pensamento


Estando livre na vida, quero cuidar da família, incluindo a mim mesmo; livre com minha pessoa, quero cuidar do meu amor. Porque há cuidado sem cura, mas não cura sem cuidado, como escreveu Andréia, sábia em sua maluquice, tendo esquecido ou não a referência da citação. Quero cuidar do corpo, que me coloca no mundo; cuidar da casa, que me protege dele, quero cuidar de Lilia, que me cura de mim. Adélia é minha pessoa, a única no mundo que, com meus próprios venenos, cria e esconde entre os cabelos e sorrisos, entre as pernas - meus antídotos. E franzindo as sobrancelhas como exige o pensamento, refletindo sobre as profundezas da minha rasa existência, entendi certo dia que minha pessoa não é aquela capaz de tudo por mim, mas aquela pela qual eu sou capaz de tudo. Adélia está amalgamada às formas puras da minha intuição, por isso me aparece a todo tempo, linda sempre, em todo lugar.

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Sobre crescer


Não é fácil ser um homem de meia idade, as tais crises são reais. Porque é chato ver a testa aumentar enquanto os cabelos recuam, parecem recuar junto com meus sonhos, não todos, só os juvenis. Curiosamente os infantis todos permanecem, até crescem. Meus sonhos infantis não param de crescer, como se houvesse um menino brincando dentro de mim, com cada vez mais seriedade. Brinco de ser feliz, com a seriedade de um adulto, e a sensatez, e a arrogância, e as fantasias… Não é fácil, ser adulto é como ser criança, e como ser velho, como ser tudo isso, e nada disso… ser adulto é horrível… é pesado. Certa noite Lara disse que costumo entupir a pia do banheiro porque não sei me barbear ou sei pouco, eu disse que não era mesmo especialista no assunto, ela disse que uma visita ao barbeiro iria bem ou aos tutoriais da internet, eu respondi que tenho tanta barba quanto dinheiro e tempo, ela riu, eu ri… e Lara me olhou como quem olha em paz a própria cara, com aceitação, e sumiu pela porta deixando na ausência sua imagem alumiada, como a cena fugaz que fica no ar do pensamento, no vazio dos olhos abertos quando cai um raio rasgando o escuro - criando um hiato no breu. Lara é minha melhor história, minha peça favorita, minha eterna namorada, enquanto quiser brincar comigo, eu vou brincar com ela. Essas reflexões todas e lembrança que me vêm agora à cabeça enquanto faço a barba, que me vêm e vêem como adulto que sou, acabam me tornando a terceira pessoa que me olha nos olhos pelo espelho - um homem de meia idade, com crises reais… ligadas às minhas mais profundas aspirações, e traumas, e medos, meus mais genuínos desejos, meus sonhos infantis - de ser adulto. Brinco antes de dormir, livre entre Lara e Adélia, leve entre os lençóis, feliz, e não é fácil.


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