domingo, 17 de março de 2013

Nos brotos.

 Há muito que venho no vale pra pensar. Eu paro e olho lá longe. Os caminhões bem pequenininhos passando na estrada, as nuvens como que lençóis sobre a cidade, as pontas dos prédios por detras do morro ensolarado, as copas frias e escuras das árvores no fundo do vale. Daqui, o mundo parece maior.

 Sento no tronco principal de uma árvore tombada, apodreceu as raízes e caiu de lado. O capim cresceu à sua volta, até no pouco de terra que levantou do chão junto com a pobre raiz, faz anos desde à queda da árvore. É um belo e dramático quandro que há tempos é contemplado pelos poucos e fiéis que frequentam o espaço.

 Gosto de vir aqui pra assentar a poeira da cabeça, ouvir a vida através do silêncio da calma. Venho ouvir  o vento, as vacas pastando, o sol subindo e o capim esquentando. As vezes eu imagino, como num filme de cenas aceleradas, o sol nascendo e se pondo, nascendo e se pondo desde sempre, desde que o mundo é mundo. Imagino o chão se mexendo e os primeiros brotos saindo da terra, vejo a vida se formando em segundos, como se não tivesse tudo acontecido ao longo de bilhões e bilhões de anos e sim num fechar e abrir de pálpebras. Tudo bem rápido e derrepentemente estou aqui, pensando nisso sentada no vale. Como se no "aqui e agora" de tudo que existe, estivesse eu, sentada na árvore deitada no vale.

 Deitada sim, a árvore está a descansar, a tomar folego depois do baque e a se recuperar. Quando o vento passa apressado, podemos ver os brotos brincando por cima dos galhos quase secos, todos sorrindo em verde claro. Depois de caída a pobre árvore não viu outra escolha a não ser secar-se quase que por inteira e concentrar-se na fina e marginal raiz que lhe sobrou fincada na terra. Confiante e paciente passou anos a engrossar sua raiz afim de que essa pudesse se tornar a raiz principal e não mais um galho qualquer. A fraca raiz pôs-se a crescer, a criar forças pra sustentar a nova folhagem que se formaria, forças pra mandar a seiva pra cima e permitir que árvore grite novamente "vida!".

 A paisagem que outrora era morta, não o era de verdade, era engano nosso, falta de sensibilidade. Na realidade não era morte e sim um quadro de humildade e perseverança. Pura sabedoria.
 Deitada sobre o chão, despreocupada, livre, renasce. Renasce a árvore, as raízes, as folhas, a vida, e eu que assisto.

 "Andei pra chegar tão longe e daqui de longe eu olhei pra trás.
  E foi como ver distante eu atravessando os meus temporais.
  Ouvi Ana me chamando, disse "se eu não fosse eu não ia mais"
  e eu vi o que a gente fez, pra chegar aqui no que agente faz..."
                                                                Lenine


Selmy Menezes

quinta-feira, 14 de março de 2013

Parte III - No colo...

 "Meu bem, não chore...". E eu choro e ele chora, e a gente chora sem saber muito se é de tristeza ou felicidade, se de medo ou de amor. Tudo se mistura, se confunde e se derrete escoando pelos olhos em salgadas gotas de dúvidas e certezas.
 Beija minha boca e abraça minha alma, minha alma de menina, que mora bem no fundo de mim, bem dentro do corpo, na essência, no quente e úmido colo que compartilho com você. Colo que embala minha feminilidade ainda cheia de contornos infantis. Abraça minha menina, me consola, me alimenta, encoraja...cuida.
 Na sinceridade dos seus molhados cílios eu guardo meu respeito, cultivo em suas lágrimas o desejo de seu sorriso...Meu bem, acomode-se,fique. Se eu chorar, é de amor.

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