sábado, 20 de maio de 2023

Registro 039

10/10/22

Sobre estar pobre


“Não dê pérolas aos porcos”, ele dizia, e arrematava “não por serem maus, mas por serem porcos, vão engolir suas pérolas sem hesitação junto com o lixo, e vão perdê-las na lama sem nem notar”. Saudade do meu pai eu sinto, da sua força que eu finjo ter herdado, do seu abraço e colo… E me sinto tão incompetente, eu precisava apenas caminhar, não? Segurando forte a bolsinha dos tesouros. Não o fiz, foram caindo, caindo, caindo… nas poças, nas pocilgas, umas joguei longe por pura revolta e o vento levou, ou o mar engoliu, e está tudo perdido, e estou cansada. Não sou como meu pai que salva pessoas, ou que finge ou acredita salvar, eu apenas crio pessoas, invento mesmo, e depois as mato morrendo junto, e tudo se repete, invento tudo, vivo, morro, invento, vivo e morro de novo… e estou cansada. E o pior de tudo… nem sempre são nossas as pérolas engolidas e pisoteadas, às vezes somos nós os porcos que chafurdando acabam com os tesouros alheios.


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